21/03/2010

Pela Sagacidade do Público



Se não para deixar os aparelhos televisivos fora do ar, no mínimo a peça de Felipe Mônaco incentiva a deixar a televisão desligada, ou menos ligada. Quando digo televisão me refiro à TV aberta nacional. Não sou a favor da alienação, mas é inegável que as emissoras brasileiras estacionaram sua grade de programação, limitando-se à repetição exaustiva de temas, ao formato padrão e apelativo, tudo em nome da dependência mercadológica. Hoje em dia chega a estar cristalino o que se vende e o que não se vende; a denúncia e a crítica social não se enquadram na primeira opção.

O ritmo da peça "FORA DO AR" reflete o ritmo do objeto parodiado, a televisão. Não existe o aprofundamento das questões, é uma forma rasa e superficial de comunicação. Sentado no Teatro Bruno Kiefer, me sentia com a posse de um controle remoto que mudava os "canais" da peça constantemente.

Não há cenário, figurino ou apetrechos. É o ator com seu trabalho e seus parceiros em cena. E que bom, porque em meio a tanta agilidade e paródia televisiva, ficaríamos tontos se o Grupo do Play tivesse optado por troca de figurino e etc. Nenhum dos quatro componentes parece carecer de qualquer bengala cênica. Não há protagonistas nem coadjuvantes, a estrutura narrativa se estabelece como um emaranhado de personagens que sintetizam a programação da televisão nacional.

De cara a peça já inicia com um programa de "assistencialismo" familiar e profissional, pretendendo resolver o conflito entre o filho (Cassiano Fraga, em processo de amadurecimento cênico) aspirante a ator de teatro, e os pais, preocupados com a consequência financeira da escolha. O pai (Felipe Mônaco, com notável carisma e desprendimento) alega que não se pode festejar e usar batom pro resto da vida. É aí que a mãe (Patrícia Soso, segura de seu talento cômico) se pergunta onde ficam os sonhos, se não deveríamos seguir o coração. Os telespectadores, ao ligarem e fazerem perguntas/opinarem, tomam parte do conflito alheio com determinação e entusiasmo. Por alguns minutos podem reger a vida do outro, sentem-se como deuses. O apresentador (Leonardo Barison, cuja atuação me surpreendeu: bastante convincente) aproveita qualquer deixa da família em questão para propagandear produtos comerciais.

A televisão é o império da imagem. Um ator com 20 anos de carreira pode muito bem ganhar o mesmo, se não menos, que um modelo estreante. Pior do que os ganhos é a baixíssima repercussão do trabalho, quando este se repete em figurações ou participações pingadas, com duas ou três falas. É muito engraçado observar o estereótipo do diretor estressado, o ambiente caótico do Projac e os envolvidos sendo tratados não como profissionais, mas como produtos. Se ri da humilhação.

É fácil distinguir uma emissora da outra pela padronização instaurada. Aqui temos o auge cômico do espetáulo: o SBT e seus programas de auditório com apresentadores afetados, honrando o camelô dourado de Silvio Santos em uma atmosfera patética, isso sem falar dos dramalhões mexicanos; a Record apostando na exploração da violência das favelas e a Globo com suas novelas de alta qualidade técnica, mas atadas ao modelo de intrigas amorosas com divisão maniqueísta das personagens.

Frente a situação absurda que se encontram nossas redes de Televisão, "Fora do Ar" é um grito pela sagacidade do público de telespectadores.

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